sábado, 24 de maio de 2008

1808


1808, de Laurentino Gomes, deve estar ainda na lista dos best-sellers das livrarias. Como estou lendo ele, resolvi escrever uma resenha, dando a dica. O livro descreve a vinda (ou fuga) da Família Real ao Brasil e de como esse acontecimento mudou os rumos da história do nosso país.

Laurentino começa fazendo um retrato dos membros da família real. Segundo suas descrições, o príncipe D. João VI era medroso e inseguro e, sendo assim, achou mais fácil fugir de Napoleão a enfrentá-lo. A vida pessoal do príncipe, da sua mãe louca e da sua mulher malévola é detalhada no texto do autor, que utiliza relatos históricos para fundamentar suas afirmações.
O livro retrata a elite do Rio de Janeiro em 1808 como sendo atrasada e simples, diferente das elites requintadas da Europa. Tudo é colhido de relatos de europeus que visitaram o país na época, convivendo com o povo e os costumes brasileiros.
Laurentino ainda mostra a transformação passada pelo Rio de Janeiro com a vinda da Família Real de Portugal. Os aluguéis subiram bastante e a Coroa Portuguesa nunca concedeu tantos títulos de nobreza num espaço tão curto de tempo.

1808 nos faz entender as origens do Brasil subdesenvolvido e “atrasado” em muitas questões como, por exemplo, a cultura. Entender isso requer analisar Portugal, país que colonizou o Brasil e que não possuía avanços científicos, pois a lei da Igreja era mais forte.

Laurentino Gomes é jornalista e, característico da profissão, escreve de maneira simples e direta. Seu texto, embora tenha fatos e depoimentos históricos pesados, é leve e fácil de ser lido.
Por fim, deixo um trecho descrevendo as mudanças na cidade do Rio de Janeiro, para que pensemos um pouco sobre os impactos ambientais do crescimento da cidade:
“Desde então, a cidade foi aplainada, aterrada, desmatada, perfurada, debastada – de modo que hoje seu traçado junto ao mar é quase irreconhecível quando comparado com o dos mapas da época da chegada da corte no Brasil”.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Cheiro de Goiaba

Talvez os livros mais agradáveis de ler sejam aqueles que contam como o escritor conheceu a literatura e explicam o processo de criação de suas obras. Como me interesso por Gabriel García Márquez, me prendi em dois livros desse tipo: Cheiro de Goiaba (1982) e a sua autobiografia, Viver para Contar.

Cheiro de Goiaba é mais fácil de ler e de gravar, talvez pelo fato de ser menor. São conversas com Plínio Apuleyo Mendoza, amigo de juventude de Márquez. No livro, o escritor colombiano revela a sua história e o que pensa da literatura, das mulheres, da política.

As partes mais importantes do livro que eu achei (claro) foram as que envolviam literatura e o começo do escritor nesse universo – um começo difícil. Seus primeiros contos foram escritos na sala de redação do jornal em que trabalhava depois do expediente, mais ou menos umas 3 da madrugada. Destaquei alguns trechos:

“- Comecei a escrever por acaso, talvez só para demonstrar a um amigo que a minha geração era capaz de produzir escritores. Depois, caí na armadilha de continuar escrevendo por prazer e depois na outra armadilha de que nada me agradava mais no mundo do que escrever”.

“- Você leva muito tempo para escrever um romance?
- Escrever em si, não. É um processo mais para rápido. Em menos de dois anos escrevi
Cem Anos de solidão. Mas antes de me sentar à máquina demorei quinze ou dezessete anos pensando nesse livro”.

Como conta no livro, Gabriel começou a se interessar pela literatura quando leu A Metamorfose, de Kafka. Quando leu a primeira página do livro, em que Gregor Samsa acorda certa manhã transformado num monstruoso inseto, Gabriel se deu conta: “então se pode fazer isso.” Foi então que nasceu a Literatura Fantástica do colombiano.



A metamorfose, Franz Kafka

O mais engraçado do livro foi a descrição de como Gabriel andava pelas ruas naquela época, quando desistiu dos estudos para se dedicar à literatura:

“Mal vestido, mal barbeado, perambulando pelos cafés com um livro debaixo do braço, dormindo e amanhecendo em qualquer lugar, dava a impressão de ser um sujeito à deriva”.

Lendo estes relatos, parece que aquele antigo escritor que se dedicava infinitas madrugadas na construção de um romance não existe mais.