terça-feira, 30 de outubro de 2007

O Realismo Fantástico dos Buendía



Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo.

Esta frase é a abertura do livro Cem Anos de Solidão, do autor colombiano Gabriel García Márquez. A obra, escrita em 1967, fez García Márquez ganhar o Nobel de Literatura em 1982 e, passados todos estes anos, continua sendo referência na literatura mundial. Por ele ser o meu livro de cabeceira, resolvi escrever algo sobre ele.

O livro narra a vida dos Buendía, família que praticamente “fundou” a cidade de Macondo, no interior latino-americano. A cidade é fictícia, mas carrega características das primeiras vilas fundadas com a vinda dos espanhóis, na época do descobrimento. A certa altura, por exemplo, o patriarca da família José Arcádio Buendía se vê desolado por notar que Macondo está longe da civilização e das grandes invenções do mundo e tenta em vão sair da cidade para descobrir o que vem além dela.

Os personagens de Gabriel García Márquez têm todos os mesmos nomes: José Arcádio e Aureliano. São tantos personagens e gerações dos Buendía que é preciso tomar cuidado para não se confundir. Montar uma árvore genealógica é uma boa solução. O mais interessante é que as personalidades deles se repetem, de geração em geração e a solidão é o sentimento que atormenta a família. Esses personagens se assemelham, de algum modo, aos do Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo. Alguém certa vez me falou que García Márquez buscou inspiração na obra de Veríssimo para compô-los.

García Márquez utiliza boas doses do Realismo Mágico para compor Cem Anos de Solidão e este é o aspecto mais marcante das suas obras. Me faltam palavras para explicar a essência do Realismo Mágico, então vou citar uma passagem do livro, em que García Márquez descreve a trajetória que um fio de sangue faz da casa do assassinado até a casa da sua mãe:

“Logo que José Arcádio fechou a porta do quarto, o estampido de um tiro retumbou na casa. Um fio de sangue passou por debaixo da porta, atravessou a sala, saiu para a rua, seguiu reto pelas calçadas irregulares, desceu degraus e subiu pequenos muros, passou de largo pela Rua dos Turcos (...) e se meteu pela despensa e apareceu na cozinha onde Úrsula se dispunha a partir trinta e seis ovos para o pão”.


Uma outra característica que aparece no trecho acima é a exatidão com que são usados os números. (Trinta e seis ovos para o pão). Isso é herança do jornalismo, profissão que foi exercida por Márquez durante boa parte da sua vida.

Consegui sintetizar as principais características da obra Cem Anos de Solidão. Só não continuo escrevendo mais sobre o livro porque vou acabar contando sua história, o que é imperdoável para quem ainda não leu o livro. Deixo então a minha dica: assim como outros livros do Gabriel García Márquez, este vale a pena ser lido. Não tem como não se apaixonar.

Quando li a biografia do Gabriel, descobri que a maioria dos personagens do Cem Anos de Solidão nasceu inspirada na família do autor – claro, com um pouco de exagero. Fiquei pensando o quanto louca era a família do autor na sua infância e acabei percebendo que era tudo uma questão de ponto de vista. Com um pouco de imaginação, podemos enxergar loucura até nas famílias mais perfeitas.
Com certeza vou escrever sobre outros livros do Gabriel, pois, assim como Cem Anos de Solidão, as histórias são fantásticas.

Outros livros de Gabriel García Márquez:

- O amor nos tempos do Cólera
- Do amor e outros demônios
- A incrível e triste história da Cândida Erêndira e sua avó desalmada
- Crônica de uma morte anunciada

domingo, 28 de outubro de 2007

A inutilidade (e o prazer) de ler

Eu nunca entendi como existem pessoas que conseguem passar mais de 72 horas longe de livros. Elas devem ter mais tempo livre – e ter viajado menos que eu.


Capitães da Areia, de Jorge Amado, foi um dos primeiros livros que caiu nas minhas mãos. Eu tinha uns 12, ou 13 anos e, mesmo sem saber quem era Jorge Amado, devorei o livro em poucos dias. Ele acabou instigando a minha vontade de ler e, dali por diante, contraí a doença dos leitores desvairados, aqueles que lêem cinco livros por férias, três vezes o mesmo livro e fazem listas infinitas de livros que gostariam de ler – e não lêem por falta de tempo.

Sempre culpei os livros pela viagem e pela vontade de viajar que eles me proporcionam. A história de um dos primeiros livros que li se passava na Escócia e me despertou a curiosidade de conhecer aquele país. Ainda não o conheci, mas a vontade continua existindo. A segunda idéia tentadora que despertei com os livros foi conhecer Machu Picchu, depois de ler a história de uma equipe de vôlei que ia jogar em terras peruanas. Essa vontade eu realizei numa viagem com meu pai, nos meus quinze anos.

Não aceito a idéia de que livros não passam de diversão e que podem ser comparados com novelas. Está certo que ambos são formas de captar a realidade, mas o livro permite uma viagem à imaginação bem mais aprofundada e criativa do que a novela.

Livro é mais do que diversão. É cultura. Faz a gente perceber que existem outros mundos além do que pode ser visto pelos nossos olhos. Ensina a escrever, a viajar, a inventar. No meu caso, é um vício inegável. Comprar um livro é uma terapia, assim como comprar roupas e perfumes em dia de TPM. Por isso, nunca consegui entender como existem pessoas que passam dias e dias longe dos livros.

Herdei o meu vício por leitura – e também uma biblioteca com 60 livros – do meu avô paterno. Por coincidência, na biblioteca, há muitos livros do Jorge Amado. Sustento este vício com esse blog, com listas infinitas de obras e autores que ainda quero ler e com algumas horas perdidas lendo coisas que muitas vezes parecem inúteis – mas que na verdade não são.